quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Ambiente e Cidadania se Misturam?

Se você mora nas áreas mais centrais e civilizadas da Cidade de São Paulo, talvez não tenha tido o prazer de encontrá-los em seu caminho. Mas se costuma frequentar os bairros mais periféricos ou as cidades mais afastadas da região metropolitana, certamente já se deparou com um carro de som fazendo campanha política para algum vereador ou até mesmo o prefeito de sua região.

Estes equipamentos, que a cada novo período eleitoral proliferam-se em velocidade absurda, são, muitas vezes, o ápice de uma campanha política e costumam receber a maior parte da atenção ou dos recursos de campanha de alguns candidatos, principalmente quando pleiteiam cargos legislativos (vereadores e deputados).


Se cumprem o seu papel e trazem aos candidatos votos caçados ao vento, ninguém saberia dizer, posto que dificilmente estas campanhas relâmpago e improvisadas possuem estudos de validação de veículos de marketing.

O que é certo é que existe, atrelada a eles uma unanimidade. À excessão dos que se utilizam destes veículos, ninguém que não ganhe dinheiro com este meio de propaganda gosta dele.

Fato concreto é que os tais carros-de-som incomodam a vizinhança com o volume extremamente alto de seus potentes sistemas, muitas vezes reproduzem grosserias, gravadas ou elaboradas ao vivo do alto de palanques improvisados sobre eles, quando este ou aquele candidato sente-se ultrajado por seu oponente, atrapalham o fluxo do trânsito ao trafegar por vias estreitas em velocidade extremamente baixa, isto quando finalmente não atravancam de vez os caminhos dos cidadãos ao quebrarem em plena via de tráfego.

Isto porque, como você já deve ter notado, a improvisação e a utilização de veículos velhos dotados de pouca, ou nenhuma manutenção, são a tônica deste mercado.

E o que teria isto a ver com ambiente e cidadania?

Pois saiba você que o alto volume de ruídos emitidos por estes veículos é um dos componentes de um grave problema ambiental das grandes cidades: a poluição sonora. A poluição sonora é responsável por uma grande quantidade de problemas de saúde física e mental dos moradores dos grandes centros urbanos. Ela também é causadora de problemas de orientação de animais silvestres que, desavisadamente, insistem em morar na loucura cosmopolita de nossas cidades.

É um componente tão grave que recebeu, dos mesmos legisladores que se utilizam dos carros-de-som, uma série de artigos, parágrafos, resoluções e portarias distribuídos em todos os níveis da legislação brasileira.

Como exemplo está o Código Nacional de Trânsito, regulamentado por uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN):

"Caracteriza infração, usar no veículo equipamento com som em volume ou freqüência que não sejam autorizados pelo CONTRAN:
Infração - grave; Penalidade - multa; Medida administrativa - retenção do veículo para regularização."
(Lei 9503/97, art. 228, caput)


"A utilização, em veículos de qualquer espécie, de equipamento que produza
som só será permitida, nas vias terrestres abertas à circulação, em nível de pressão sonora não superior a 80 decibéis - dB(A), medido a 7 m (sete metros) de distância do veículo."
(Resolução CONTRAN 204/06, art. 1º, caput)


E, como explicar o fato de que candidatos à câmaras legislativas ou aos cargos majoritários não conheçam ou não se importem em infringir as leis que serão cuidadas por eles próprios?

A resposta: falta de cidadania.

Se em nosso amado Brasil, houvesse uma política de fiscalização e punição daqueles que infringem as normas, certamente barbaridades como esta não estariam ocorrendo. Veja que nossos queridos candidatos, mesmo antes de tornarem-se inatingíveis aos braços da lei pelos pressupostos de imunidade parlamentar, já agem como se fossem maiores do que os cidadãos comuns. Agem como se vivessem num lugar onde o poder os coloca acima das leis e onde a sociedade possui escalonamentos que dizem que classe de cidadão tem mais direitos ou mais deveres.

Dia destes ouvi numa entrevista radiofônica um comentário de nosso grande ministro e presidente do TSE, Marco Aurélio Mello, sobre um assunto qualquer, que disse: "...o problema é que os brasileiros não estão acostumados a cumprir regras, principalmente os que vivem na esfera pública..."

Pois, se estivessem acostumados a sofrer os castigos pelas regras infringidas, certamente não se teriam acostumado a descumpri-las.

Lembro-me de quando minha avó (que era muito bondosa, mas não uma santa) nos ameaçava, durante as extripulias mais atrozes de nossa infância, com uma tira de couro que dizia ela ter sido retirada do último porco que assara. O medo de ter aquele troço estalando em nossas pernas expostas pelas calças curtas fazia com que eu e meus primos deixássemos de lado, quase que imediatamente, qualquer pensamento ou atitude que pudesse desagradar à matriarca de nossa família.

E não o fazíamos somente pela ameaça, nossa quase petrificação advinha da lembrança da dor em nossas férteis e inexperientes mentes das vezes em que não havíamos levado a ameaça a sério.

E, já que nossos defensores das leis mostram-se incapazes de cumprir com sua obrigação, porque não tomamos nós esta atitude, por que não lhes mostramos a tal tira de couro? Da próxima vez que se sentir estressado pela presença irritante de um destes equipamentos, ao invés de apenas xingar, anote o nome e o número do candidato, escreva para seu comitê de campanha dizendo que não votará nele explicando o motivo e, quando chegar a hora, não se esqueça de cumprir a ameaça.

Divirtam-se sempre... Mas continuem se esforçando em cumprir as regras.